Classificar CV e PCC como orgs. Terroristas é mesmo uma boa ideia?

Publicado em 08/05/2025 14:40

O Direito Internacional Humanitário é um ramo do Direito que tenta "regular" os conflitos armados. Doravante, vamos chamar só de DIH. Dito isso, o DIH separa os conflitos armados em duas categorias: 1- Conflito Armado Internacional e 2- Conflitos Armados Não Internacionais. Segundo o artigo 3 comum às Convenções de Genebra e o Protocolo II adicional, para que o DIH se aplique a um conflito não-internacional, dois critérios fundamentais devem ser atendidos: 1- Organização do grupo armado: O grupo deve ter um comando responsável, estrutura hierárquica, capacidade de conduzir operações militares organizadas, e meios de implementar o DIH. 2- Intensidade das hostilidades: Deve ultrapassar o nível de distúrbios internos, tumultos ou operações de manutenção da ordem pública. Envolve confrontos armados prolongados e significativos. 📌 Análise Aplicada ao Contexto Carioca: Facções como o Comando Vermelho (CV), TCP, ADA e milícias apresentam estrutura hierárquica, comando definido, regras internas, uso de armamento pesado e controle territorial. 2 - Intensidade: Enfrentamentos com forças de segurança estaduais e federais (operações em favelas, uso de helicópteros de combate, mortes em larga escala) podem atingir nível de conflito armado localizado. 💡 Conclusão parcial: Em alguns episódios, há argumentos jurídicos para classificar a situação como conflito armado não-internacional, especialmente quando o Estado emprega meios militares e as facções respondem com uso contínuo de força armada organizada. 🩸 Consequências jurídicas da aplicação do DIH, se configurado como CANI: Aplicam-se as normas do artigo 3 comum às Convenções de Genebra e do Protocolo II (se ratificado pelo Brasil). Condutas como execução sumária, tortura, uso de escudos humanos, ataques a civis e saques seriam considerados crimes de guerra. Combatentes não são reconhecidos como “beligerantes” no sentido clássico e não têm direito a status de prisioneiro de guerra. ⚠️ Desafios da aplicação prática do DIH O Estado brasileiro classifica facções como organizações criminosas, não partes em conflito armado. 📌 1. E se a guerra do RJ fosse tratada como um Conflito Armado Não Internacional (CANI)? Aí o jogo muda. Se a gente rotula a guerra contra o CV, PCC e outras facções como CANI, a lógica do Direito Internacional Humanitário (DIH) entra em campo. Isso quer dizer o quê? Que os faccionados poderiam ser tratados como "combatentes" não estatais. A polícia e as forças armadas brasileiras teriam que seguir regras diferentes, mais rígidas, especialmente no uso da força, detenções e tratamento de prisioneiros. Exemplo: o confronto com um faccionado armado deixa de ser simples repressão criminal e passa a ser combate armado. Isso abre margem pra eles exigirem "direitos de combatente", inclusive podendo ser considerados prisioneiros de guerra. 🧨Resumo prático: reconhecer um CANI no Brasil seria abrir um precedente perigoso. Eles ganham status, a polícia perde liberdade de ação, e o Estado vira alvo fácil de cobrança internacional por violações de normas de guerra. 📌 2. Intervenção estrangeira com base na “luta contra o terrorismo”? A gente entra aqui na famosa doutrina Unwilling or Unable. Funciona assim: se um Estado não quer ou não consegue combater uma ameaça terrorista dentro do seu território, outro Estado poderia, em tese, intervir. ➡️ Exemplo prático: os EUA justificaram assim vários bombardeios contra o ISIS em países onde não estavam oficialmente em guerra. Israel fez isso em Entebbe. França, em Mali. ➡️ Se o CV ou PCC forem classificados como grupos terroristas internacionais e estiverem ameaçando estrangeiros (como tráfico de armas, drogas ou ataques cibernéticos pra fora do país), os EUA, por exemplo, poderiam alegar que o Brasil não está dando conta e intervir. Pode ser por sanção, operação encoberta, ataque cirúrgico, bloqueio, etc. 🧨Resumo prático: o Brasil perderia soberania. O Exército brasileiro deixaria de ser o único “legítimo” operador armado no território. E abriria precedente pra outras potências fazerem o mesmo. 📌 3. Faccionado como “combatente legítimo”: pode atacar e se defender? Se a gente reconhece um CANI ou dá a esses caras status de combatente, vem o direito à autodefesa. Isso significa que o traficante não é só um criminoso qualquer — ele vira parte em um conflito. Se ele atira num policial ou militar, isso pode ser interpretado como ação de combate, não crime. 🚨 Imagine o que isso gera: um PM ou Fuzileiro morto numa troca de tiro com facção pode ser considerado “morte em combate”, e o autor pode querer se blindar de processo alegando “legítimo combate”. 🧨Resumo prático: seria uma inversão moral absurda. O Estado perde o monopólio da violência legítima. Facções ganham espaço político e jurídico. 📌 4. O que as facções mais querem? LEGITIMIDADE. O CV e o PCC não querem só vender droga. Eles querem ser atores relevantes, controlar território, negociar com Estado, ter base social. ➡️ Se o Brasil os reconhece como parte de um conflito, mesmo que involuntariamente, isso dá força pra eles dizerem: “Somos poder paralelo. Somos parte do jogo.” ➡️ Pior ainda: se outros países reconhecem, aí sim vira um problemão. Eles podem receber financiamento de outros grupos, acolhida política, até treinamento por outros grupos insurgentes. 🧨Resumo prático: o dia que um membro do CV for reconhecido como “combatente não estatal” por algum país, o Brasil perde uma batalha política enorme. A favela vira reduto de poder, quase um mini-Estado. 📌 5. Faccionado preso fora do Brasil: vai pra cadeia internacional? Primeiro: brasileiro nato NÃO pode ser extraditado. Tá lá no Art. 5º, inciso LI da CF/88. Mas e se um membro do CV for preso em outro país — Bolívia, Paraguai, Venezuela — e for acusado de terrorismo internacional? ➡️ Ele pode ser mandado pra uma cadeia internacional (tipo uma prisão da ONU ou em Guantánamo)? Aí que entra o problema: Tecnicamente sim, se for estrangeiro ou se tiver dupla nacionalidade. Se for brasileiro nato, o Brasil teria que permitir voluntariamente. O que hoje é quase impossível. Agora, se ele cair numa cadeia internacional, ele não vai pra morrer... Ele vai fazer “mestrado” e “doutorado” do crime. Vai trocar ideia com jihadistas, guerrilheiros, traficantes internacionais. Vai aprender sobre contrabando de armas, rota de tráfico humano, financiamento via cripto e por aí vai. 🧨Resumo prático: prender um faccionado brasileiro em outro país pode ser um tiro no pé se ele virar “aluno” de redes muito mais perigosas do que as que ele conhecia no Rio ou SP. 📌 Resumo geral (prático, direto e reto): Tratar o conflito do RJ como CANI é perigoso. Dá munição jurídica e simbólica pra facções. Intervenções estrangeiras podem sim ocorrer, sob doutrina de “incapacidade do Estado”. Faccionado pode virar “combatente” e ganhar mais direitos do que devia. Facções querem LEGITIMIDADE — e isso seria uma medalha pra elas. Prisão internacional = escola do crime internacional.

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